quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A herança do Delinqüente

Depois de uma história de amor entre espécies que acabou numa hereditariedade gasosa, sinto-me compelida a contar uma história de amor entre classes... a Lady e o Delinqüente!

Eu não sei bem quando foi que o amor nasceu, nem me lembro de ter algum dia visto o Delinqüente pequeno. Lembro-me dele já como era adulto, flanando despreocupadamente pelas ruas do bairro de atiradores(acho que o nome se devia à quantidade de pais que precisavam espantar visitantes madrugadores), em Joinville. Ele não era especialmente charmoso e, na verdade, havia uma rixa familiar entre ele e nosso cão, o Rex, um belo vira-latas branco e creme.

Também não lembro de como Lady entrou em nossas vidas. Não lembro dela pequena, é como se a infância dos outros não existisse para mim. Apenas lembro que existiam. Rex ficava em nossa garagem, era o trabalhador padrão, vigiava a casa e o carro. Lady ficava no meio da colina, a própria dama do morro dos ventos uivantes, mas sem os ventos, apenas com eventuais uivos sei lá de quem.

Nossa casa começava na rua de baixo e o nosso terreno ia subindo até a rua de cima, mas, como naquela época ainda se amarrava cães com lingüiça, meu pai não sentiu necessidade de fazer muros. Na verdade, existia apenas um enfeite de muro na frente de casa, não sei se para fazer charme ou conter a terra.

E foi essa confiança excessiva na honestidade dos tempos que pôs tudo a perder...

Chegou um dia em que Lady entrou no cio! Rex nem se abalou, ele tinha sua própria namorada e, como a namorada lhe era fiel indo à nossa garagem para fazer filhotinhos(ainda bem que a família dela nunca entrou com pedidos de pensão, caso contrário Rex, ou meu pai, estaria na prisão até hoje...), nunca olhou para Lady com intenções de quermesse...

Mas Delinqüente.... ele ficou doidinho! Lady era bem jeitosinha, corpo esguio, morena clara, pêlos lisos... Numa terra de colonização alemã, as morenas faziam sucesso!!

Para evitar o indesejável, mamãe botava Lady para dentro sempre que saía e Delinqüente ainda tinha um restinho de ombridade para não invadir a alcova de uma donzela com a família em casa...

Assim sendo, por dias ele orou e vigiou até que... mamãe saiu e esqueceu a virtuosa do lado de fora! E lá se foi a virtude: mamãe chegou e encontrou os dois em meio ao ato amoroso, num sublime deleite que, mesmo interrompido, gerou 5 bolinhas com cara de pastor e corpo de teckel-lata! Foi o horror!!!

Conseguimos bons lares para os pequenos órfãos, visto que Delinqüente nunca mais voltou à nossa casa, nem mesmo para ofertar um saco de fraldas à envergonhada mãe! Depois de a porta arrombada põe-se um cadeado: meu pai viu que construir um muro para preservar a virtude perdida sairia muito caro, então a pobre Lady foi levada para morar com nossa diarista numa casa de campo... É o que sempre acontece às jovens ingênuas que caem na cantada fácil desses experientes garanhões, esses escroques da sociedade burguesa decadente!

A despeito de minha tristeza, soube que Lady se adaptou muito bem à vida no campo, não sei se teve mais filhos, se por ventura se casou com um camponês, mas parece que morreu velhinha e feliz e, no fim, é isso que importa!

Pat


5 comentários:

Batata disse...

Mate minha curiosidade... Como se chamaram as cinco bolinhas de pêlo?
teriam sido Larápio, Delinquente, Marginal, Amigo do Alheio e Político?

Dante è con te disse...

Na verdade não nos deixaram nomeá-los... sabe como é: batizou, ficou!

Unknown disse...

ainda bem que, pelo menos entre cachorros, histórias de amor acabam bem... parabéns, pat, pela sua habilidade de entrar na alma dos animaizinhos - graciliano ramos, que inventou a baleia, ficaria com inveja!!!!

Batata disse...

Agora é que fiquei confuso: a baleia, que é um cetáceo, na verdade era uma cachorra?!!

Dante è con te disse...

Batata, meu fofo da virgulinha, a Baleia do Graciliano era uma cadelinha!

Pascoal, meu querido, vindo de ti é um super-elogio(só não sei se vai o raio do hífen)!